Eu sendo Pó e sia

          A distância para alguns é dolorida mas na minha vida sempre foi uma amiga e das mais presentes companhias. Ainda criança com de 3 anos, conheci a distância, quando ela chegou e decidiu morar entre eu e painho, a foice da vida roçou essa flor do meu jardim, mas minha mãe se metamorfoseou em uma flor muito mais forte, resistente e bonita. A mente libertária do colo materno e a necessidade de ter tempo para correr atrás da sobrevivência, fez a distância se manifestar outra vez, a partir dos dez anos de idade, fui andar pelos rastros na estrada deixados por sonhadores pobres de comida, mas ricos e fartos de sonhos e curiosidade.

          Me distanciar de pessoas amadas me aproximou de ciladas e armadas, mas também de pessoas apaixonadas, que ficaram no meu peito marcadas. Mais um vez embarquei, para uma distância ainda maior, peguei carona na utopia, aos quatorze em lona preta me transformei, sangue, suor e lágrimas experimentei e a dor dos mártires na mística me curei, sob a bandeira vermelha me deitei e nos cafezais e canaviais eu me desafiei, na madrugada escura enquanto preparava a “bóia”, ganhava da companheira do barraco do lado um café ralo com pouco açúcar, mas com cheiro de luta e gosto de revolução, cuja fonte da coragem era a reforma agrária no chão.

          Enquanto as coisas novas vão surgindo cada vez mais rápido nas grandes cidades, na roça estávamos parece que em outra sociedade, e a distância nos olhava com uma cara feia e xingava palavrões, zombando de um povo que a qualquer coisa nova achava muito estranho.

          A distância decidiu sempre estar na minha companhia, aos dezoito senti as costas arder, por que dois brotos dos ossos saiam e em um passe de mágica, asas grandes nasciam, e por ironia, na cidade grande a metamorfose se completaria, além de asas, para proteger esse corpo magro e maltratado ganhei a armadura as armas de Ogum, pra me fortalecer nessa guerra e abrir os caminhos ora tortuosos ora floridos e no meio do caminho a Deusa da sabedoria me deu uma metralhadora, que dispara conhecimento e poesia, que desintegra a ignorância e afaga os corações insatisfeitos.

          E a distancia? Vez ou sempre ela aparece, o que se aproxima é golpeado por ela, que aos poucos nos distancia, para talvez, renascer o bem em gente, pedra, pau ou poesia!

Cotidiano

Vermes
nas escondidas assassina,
estão nas ruas
provocando chacina
Abusam da autoridade
até com menores de idade
Vermes que se impõem
como donos da cidade.
quantas vezes na rua,
aliás,
por motivos fúteis
apanhei de policiais.
Pela minha cor, pelo meus traços acham que tem direito de me tirar palhaço,
e quantos irmãos meus
tem a vida perdida em estilhaço
A sociedade racista aprova e aplaude um presidente
que diz na cara dura e doente
– Carta branca para polícia
assassinar preto inocente
qualquer um que escolher e estiver na frente
menos da TV!
que mente
a cada segundo entrando na sua mente!nossa arma e defesa é
estar aqui declamando poesia
Ou embalado no rap na melodia
pode até ser
momento político ou de lazer,
mas me perseguem na rua,
e o que eu quero e simplesmente admirar a lua,
sem ter receio de tomar batida ou baculejo na rua!
desconstrua!
fica na sua!
não me exclua!
propriedade não sou sua!
paz para minha vida
e para a sua!
se liga nos nó
se liga nos verme
que querem no transformar em pó!

Oração aos desavisados

O mundo foi feito do ferro quente no couro de boi, de índios, de negros e de periféricos, favelados ou nos campos. Duas mães solteiras e fartas de seios e alimento, foram ceifadas de seus filhos: Mama África e Pachamama, viram seus filhos se encontrarem no cativeiro da terra e do corpo, onde o inferno subiu e o céu desapareceu.

Nas sinagogas, história pra boi dormir! Carochinha virou fichinha na boca hipócrita dos profetas pedófilos e viciados em ouro, sedentos pelo sangue espremido nas senzalas, nos canaviais, nas fábricas, nos bregas, nas penitenciárias, nos ônibus e metrôs, que no milagre babilônico é transformado em miseráveis moedas e notas amassadas, contadas uma á uma, pra chorar o pão de cada dia, e mesmo assim o sacrifício é entregue nos saquinhos ou nas caixinhas dos altares, na esperança do milagre de multiplicar os peixes magros das cestas vazias. Mas na verdade quem puxa a rede desse mar de desesperados e fica com a parte pesada da balança injusta, são os abençoados e ungidos pastores comedores de ovelhas.

Deus pai que me perdoe, mas teus filhos estão abandonados a própria sorte, e como órfãos, nas igrejas muitas vezes encontram esperanças frustadas, como muitos nos abrigos e orfanatos do mundo, que são escolhidos por famílias que os adotam, mas não os amam de verdade. Mas como o mundo, Deus é mãe, onipresente na sinceridade da nossa prática do amor, do perdão e do respeito! Pouquíssimo presente nas divinas construções, pelo contrário, que vejo são aversões, pessoas sem o poder interno das visões, guiadas por máscaras que escondem vilões.

Para sobreviver ás surpresas do jogo da vida é necessário calma, serenidade, plantar o bem, disposição e coragem pois são a fonte da liberdade, raiva as vezes, pois é um bom tempero, mas apenas se necessário. Bendito seja o amor que nos uniu, dedicados em cada ato, em cada palavra, em cada olhar, AMÉM!

Re(ve)lação abusiva

              Como planejado, ele saiu com sua esposa da capital paulistana, e na pequena cidade do interior de Minas Gerais veio fundar a sua igreja, pastor Paulo, nome de santo, e dos famosos!
Lajinha foi o lugar revelado, nos sonhos do conquistador de almas e nos olhos brilhantes do amante dos cifrões.
Vão vendo!
Fez alguns convites de porta em porta, antes de chegar já tinha gente do lugar que sabia dos negócios e como sócios preparou o terreno, antes do plantio das idéias, não demorou muito, dum local improvisado, logo ganhou “endereço certo”, e como os peixes, os fiéis e o pão de cada dia de Paulo foram multiplicando.
Foi ganhando prestígio e admiração, por seus sonhos revelar coisas do coração, direto de Deus o dom da adivinhação, mas esse apostolo tinha ouvintes que se rastejava pelos chãos dos lares como as cobras de Adão e Eva, que facilitavam o milagre do pastor.
No culto juvenil de quarta feira, Sara menina de 14 anos, inteligente, talentosa com sua voz nos louvores, foi abraçar o pastor para despedir ao final da cerimônia, mas sentiu um abraço diferente, e nunca tinha sentindo daquele jeito, também percebeu o que não via antes, depois do abraço um olhar de “cachorro na porta do açougue”, ficou entre a dúvida e o choque.
No dia seguinte Paulo não perdeu tempo, teve mais uma revelação, mas somente Sara foi escolhida para ouvir, disse o que senhor Deus revelou, que ela seria sua esposa para servir a Deus e ajudar a conduzir a obra, e outra! não podiam falar isso para ninguém, para não quebrar a promessa divina, pobre menina, não sabiá que seu coração estava na guilhotina.
Passaram alguns dias sem tocar no assunto, Sara sem quem conversar e desabafar, não teve escolha na hora em que ele chamou ela para dentro do carro alguns minutos depois de sair da escola, em pleno ensino fundamental. Falou que era o dia escolhido e que já não aguentava mais, de vontade de beijar ela e sentir a benção divina, a pequena Sara, diante do boa pinta do prestigiado pastor, sem defesa se entregou dentro do carro, a alguns quilômetros da pequena cidade, no silêncio distante dos cafezais.
Passaram alguns meses e isso se repetiu, ao mesmo tempo que muitas outras revelações surgiam e as vezes só algumas meninas ouviam.
Passaram se dois anos e meio e Sara começou a cobrar de Deus a promessa e poder contar para as pessoas para ela especiais.
A esposa do pastor que com os negócios desanimou, e com os abusos que sempre acobertou, da relação se despediu e para São Paulo partiu. E Sara com 18 anos agora, o relacionamento para a igreja o pastor assumiu, depois de quatro anos, olha o que o destino sucumbiu.
Depois destes quatro anos de abusos sexuais, Simone, outra amiga da igreja  de Sara, de 16 anos, teve um surto psicológico por que não aguentou esconder que estava grávida do pastor e não podia falar para ninguém, e no surto a notícia foi quem revelou, que as ovelhas estavam sendo devoradas pelo pastor, pois outros casos pipocou de meninas que caíram na lábia do abusador.
O sonho de Sara se esfarelou, e na depressão entrou, com o casamente, com o amor e com Deus ela se desencantou, pois o Pastor também para São Paulo correu. A igreja fechou e os fiéis a pobre menina julgou, alegando que ela desviou o pastor. E por ironia da história, outra vez como no passado, “crucificando Cristo e adorando Barrabás”.

Femicídio duplamente qualificado

                 Sirlene e Josué, um casal que um dia se encontrou como um vento fresco e leve no rosto, foi prazer, foi bom, se apaixonaram, não demorou muito se juntaram, ele sem muito estudo, trabalhador rural, lavrador, peão dos patrões, na cafezais sustentou e criou 6 filhos, na cidade do interior de Ibatiba, nos fins de semana e muitas vezes no meio da semana ele se afogava no álcool, machista valente, na frente dos filhos humilhava a mãe e se dizia ser o chefe, que incoerente, e as crianças infelizmente tinha que ver sobre a mãe a violência acontecer, quinze anos passou e o amor saiu pela janela, e a Sirlene pela porta da frente da relação se despediu, para a cidade grande ela partiu, para ser livre e independente, trabalhar e tentar viver outra vida longe do abuso frequente. Para a cidade pequena, ela sempre voltava, para ver os filhos, aquecer com seu abraço, as crianças que a aguardavam com saudade. Mas Josué sempre dizia, “Se não for minha não vai ser de mais ninguém”.

      Maldita seja a propriedade privada, seja qual for, mas principalmente e profundamente a do corpo e do amor. no dia 25 de março de 2015 Sirlene sentiu saudade e voltou a pequena cidade, para abraçar pela última vez os seus pequenos filhos, pois o destino viria a colocar-la na triste estatística da violência brutal contra as mulheres nesse país colonial, onde os homens praticam a mais violência brutal.

              Na antiga rodoviária ela desembarcou, com sorriso no rosto e a saudade no peito, a filha Amanda, o filho Gustavo e o seu irmão a esperava para levar para casa, mas do outro lado da rua Josué espreitava sorrateiro, frio e calmo planejava o derradeiro. A caminho de casa, Sirlene os filhos e o irmão, caminhavam conversando na distração, até aproximar o pai ciumento que não aceitava a separação, as acompanhou e pelas ruas caminharam juntos, em poucos minutos de conversa não demorou para ele cumprir a promessa, e debaixo da camisa tirou sua própria sentença, com uma faca Sirlene teve seu corpo perfurado, Amanda desesperada, com a mãe preocupada entrou na frente e tentou salva lá, mas nem ela foi perdoada, também pela faca foi atravessada, no meio da rua quase em frente a velha rodoviária, na tragédia nem o cunhado ele perdoou que uma facada no braço tomou.

             A família se acabou, os filhos que viveu, parece que a morte tbm conheceu, pois a vida sem sentido ficou. Josué na mesma hora correu, alegando ter medo de ser linchado, que desgraçado. A pessoas que testemunharam indignados ficaram, e um policial que tava de férias e que por ali passava foi acionado, foi atrás do acusado e por surpresa ainda estava com a faca e o sangue da vítima na mão, chamou outros policiais que estavam em ação e para delegacia levou o assassino fujão. Hoje estive no seu julgamento, triste e sem defesa, não teve como não confessar. A lei Maria da Penha se fez valer, e a promotora com orgulho fez a justiça acontecer! confessou o crime e na cadeia o sol quadrado ele vai ver, mas os filhos estavam na platéia, atrás de mim, escutava o tempo todos os choros de dor, saudade e raiva do pai assassino, indignados com essa vida.

           Mais uma vez o ciúme e o machismo destruiu uma mulher, uma família. Quanto tempo o filhos de Sirlene vão viver? Eu não sei, mas Josué na cadeia por 30 anos no mínimo na cadeia vai padecer. Será que isso paga o sofrimento que os filhos vão ter que conviver? e quantas Sirlenes ainda vão ter que morrer para os homens mudar pra valer, e a justiça de fato acontecer? do jeito que eu vejo no meu Estado as mulheres morrer, eu não vou estar mais aqui para ver esse sonho virar realidade e o respeito pelas mulheres ser uma verdade.

Construtor

Perdi meu emprego, fiquei logo no desespero
Um amigo disse: Se acalma companheiro
confia no santo milagreiro
é, quem manda eu não estudar pra ser engenheiro
Na mesma semana comecei a trabalhar
de ajudante de pedreiro
Tô com saúde e meu corpo ta inteiro
Faço masseira, carrego lajota
subo escada, quebro concreto
Se reclamo o pedreiro fala: para de exagero!
Construindo casa e edifício
nessa dura arte de ofício
Nenhuma vitória se conquista sem sacrifício
Nesse mundo tem tanta coisa precisando
se reformado ou construído
e eu refletindo meio a ESMO
decidi ser construtor
de mim MESMO!

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Globaliz(ação)

Minha terra tinha palmeiras
onde catavam sabiás
Mas assim como nossas riquezas
Os europeus levaram pra lá!

Isso, foi o começo de uma era
onde houve a valorização do capital
e as pessoas? fora deixadas a vera

Mas é lindo, não é mesmo?
a tal da globalização, que nos tira do esmo
as mensagens são enviadas
daqui ao Canadá
e em viagens que durava dias, em minutos você vai chegar

Mas isso é aparte boa
a verdade eu vou te falar
para que serve a maravilhosa globalização?
para nossa identidade arrancar!

Países que perdem a cultura
é a perfeita enganação
padrões ditados a todas e todos
e o esfriamento do coração

Isso, é a globalização
a nova colonização
ditada pela mais poderosa nação!

(Co)lheitas

Andei só
Pelo universo vazio que o coração cria
Mente e corpo doentio
Será que a fé alivia?
e a farsa que consumismo cria?
Na hora da perda
do tapete puxado
Rasteira e rabo de arraia
Atos sendo julgados
Colhe, colhe, colhe
Nessa colheita abençoada
as vezes maldita
Não só o que plantou na vida
Mas também das sementes que jogaram no seu quintal
ou na fertilidade do seu solo mental
Erva daninha, invade, se alastra
E se alimenta da sua estrutura vital
O coração fica cego
e agora vagando no próprio ego
No universo vazio
andei só
No deserto
sem pirâmides
nem faraós